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Histórias da Casa Branca: O paradoxo Obama


Texto publicado no site de A BOLA, secção Outros Mundos, a 14 de Agosto de 2010:

O paradoxo Obama

Por Germano Almeida


«Esqueçam o «fantasma Carter»: quem, como Barack Obama, conseguiu aprovar a Reforma da Saúde e a Reforma Financeira em menos de metade de um mandato já não corre o risco de passar por uma presidência falhada. Os que tentam equiparar o actual Presidente ao antigo governador da Geórgia estão a ignorar as conquistas objectivas que Obama já assegurou em tão pouco tempo. O que está a correr mal, então?

Antes do mais, o momento político em que Obama emergiu. Nem houve tempo para saborear a euforia: os primeiros meses foram gastos na aprovação de um gigantesco Plano de Recuperação e Reinvestimento que custou a Barack a perda de uma boa parte dos independentes que, a 4 de Novembro de 2008, votaram nele numa proporção de quase 7 para 3, em relação a John McCain.

E o maior problema é que as perspectivas no plano económico são de uma recuperação tão lenta, mas tão lenta, que dificilmente impedirão os democratas de sentirem fortes repercussões eleitorais nas «midterms» de Novembro.

No campo democrata, o nervosismo é evidente. Há alguns sinais que apontam para uma certa divergência de posições entre a Casa Branca, liderada por Barack Obama, e os congressistas democratas que, supostamente, constituiriam a sua principal base de apoio político, no Capitólio.

Harry Reid, líder da maioria democrata no Senado, foi um forte aliado de Obama na «final push» pela aprovação da Reforma da Saúde, mas terá desabafado, por mais do que uma vez, nas últimas semanas, junto de outros congressistas democratas, que o Presidente deveria ser menos tolerante ao compromisso com os republicanos, em questões fundamentais para o Partido Democrata.

A tensão era quase inevitável, num político com as características singulares de Obama: nas eleições presidenciais, conseguiu juntar segmentos até então inconciliáveis. Mas, como Presidente, esta junção improvável de centrismo em questões como o Afeganistão, o Iraque ou mesmo o controlo de fronteiras e «intervencionismo» em temas económicos, com forte propensão para o «big government», tem grandes riscos de lhe criar problemas.

Indefinição
Num tempo em que os rótulos são importantes, esta junção desconcertante põe muito boa gente confusa: mas, afinal, Obama é liberal ou centrista?

Podíamos apontar três ou quatro exemplos de decisões importantes da sua ainda curta Presidência para sustentar uma tese... ou outra. A conclusão terá que ser, por isso, a de que Obama não se tem preocupado em colar-se a nenhuma «tribo» – mas o problema é que, com essa atitude invulgar, acaba por não receber a legitimação de nenhum dos lados.

Os liberais não lhe perdoam decisões como o reforço de tropas no Afeganistão ou a progressiva intenção de limitar a entrada de imigrantes ilegais em território americano. Os centristas (e os republicanos moderados, que em alguns estados lhe deram a vitória há ano e meio) continuam a olhar para Obama como um Presidente «demasiado liberal».

Recente sondagem aponta para que 57 por cento dos eleitores americanos têm essa opinião sobre Barack, o que explicará, em parte, os seus problemas de popularidade.

Comunicação
Seria muito improvável imaginar que essa seria uma das principais falhas de Barack Obama, se nos lembrarmos da campanha fantástica que o levou à Casa Branca.

Mas uma análise aos factos é suficiente para perceber que a comunicação está a falhar, pelo menos nesta fase da Administração Obama. A dimensão histórica do que já foi conseguido, e em tão pouco tempo, não está a ter os devidos proveitos políticos.

O desabafo de um conselheiro de topo do Presidente Obama, que falou sob anonimato para uma peça do «Politico.com», assinada por John Harris e Jim Vandehei, diz quase tudo: «Chega a ser frustrante que a Presidência Obama não esteja a parecer um enorme sucesso, quando tinha tudo para o ser. A Reforma da Saúde, a Reforma Financeira, a maior eficácia no Sistema Educativo, a Energy Bill muito bem encaminhada... Conseguem imaginar, por exemplo, Bill Clinton a ter conseguido apenas uma das coisas que Obama já alcançou? Parte dos nossos problemas têm a ver com o facto de estarmos divididos, mesmo à esquerda... E outra parte tem a ver com a cultura de gratificação imediata que nos invadiu».

Contradição
Há, por isso, uma enorme contradição a perseguir Obama: ele corre mesmo o risco de protagonizar a «presidência fracassada mais bem-sucedida da última geração» (a frase, brilhante, é de Peter Daou, antigo conselheiro de Hillary Clinton).

O «paradoxo Obama» está, pois, identificado e definido pelos analistas políticos. Será que Barack vai conseguir sair dele antes de Novembro de 2012?»